
Desculpas, artimanhas, disfarces, ilusões, falseamentos dos fatos, formalidades encobridoras de sentimentos reais, comentários evasivos e mentirinhas de amor.
Quem está imune a sofrer ou aplicar aos atos humanos, artifícios que, cotidianamente, travestem de verdade pequenas ou grandes mentiras?
Talvez uma das respostas à questão seja que temos consciência de que a realidade tem força sobre nós e define boa parte do nosso destino. Por causa disto, muitas vezes, consideramos cômodo o refúgio em fantasias e ilusões que a negam ou amortecem.
A Literatura ilustra o medo de encarar a realidade inexorável. Um exemplo está em Angústia, obra de Graciliano Ramos, quando, Luís da Silva, o protagonista, diz: ‘Quando a realidade me entra pelos olhos, meu pequeno mundo desaba’.
O embate entre verdade e ilusão e a resistência de encararmos realidades distintas do que concebemos é tão central que é o tema da alegoria da caverna, exposta por Sócrates em um dos diálogos escritos por Platão.
Para entendermos esse eterno conflito entre o verdadeiro e o ilusório é preciso, antes, fazer uma distinção entre o que é a realidade e o que seja a verdade.
Costumamos utilizar os dois termos como sinônimos. Contudo, a realidade ou real é o que está dado. É o fato, fenômeno ou objeto em si. Daí ser sempre indomável e impessoal, pois o real é o que é ou ocorre objetivamente, livre de interpretações e olhares.
Por sua vez, a verdade é um olhar sobre a realidade objetiva, a verdade tem sempre um caráter pessoal, pois é a visão de alguém sobre o real.
Nesse sentido, é ilustrativa a visão de Drummond no seu Poema da Verdade, cujos versos dizem: “Arrebentaram a porta. Derrubaram a porta. Chegaram ao lugar luminoso onde a verdade esplendia seus fogos. Era dividida em duas metades diferentes uma da outra”.
De fato, não tocamos diretamente o real, nos relacionamos com ele indiretamente, a partir da percepção. Daí, que um desafio humano seja traduzir o real, rico e complexo, de forma aproximada e livre de inclinações e interesses.
É impossível sobreviver ignorando o real, razão pela qual, a despeito de ser impossível traduzi-lo perfeitamente, precisamos esgotar os recursos de pensamento, linguagem, afetos e emoções para decifrá-lo.
É desse esforço de tradução do real que nasce a verdade como território coletivo, como união sinérgica de olhares subjetivos movidos pela intenção comum de desvendá-lo de forma honesta e bem-intencionada.
E o trabalho coletivo de construção da verdade não é opção. É exigência humana, uma vez que a convivência, o trabalho e as relações dependem da capacidade de construir a verdade comum da forma empática e benéfica.
A Alegoria da Caverna, exposta por Platão, fala do esforço dos que saem da caverna e veem a realidade que está fora dela, mas fala também da resistência dos que nela permanecem de aceitar uma realidade diferente.
Na Alegoria da Caverna está implícita a pergunta: somos como os homens que só aceitam a verdade da caverna ou somos como os que saem e percebem a multiplicidade do real?
Muitas vezes, somos como aqueles homens acorrentados no fundo da caverna de Platão. Presos a um universo particular, enxergamos a realidade com profundo fechamento de visão para o que é diferente.
Então, vivemos a ‘verdade da caverna’ e nos recusamos a ver a realidade que vem de outros olhares e como nos apegamos apenas à verdade da caverna, nos recusamos a ouvir argumentações que visem à clareza da situação, utilizamos palavras que dão aparência de verdade ao que é apenas um ponto de vista pessoal e, por isto, é reduzido.
Nas discussões, nos apegamos à nossa ideia ou visão e nos debatemos no mero combate, que não raro, resulta de narcisismo ou ardor egoístico de exercer supremacia.
Seguimos esquecidos que o real é indomável e só é traduzível pela verdade presa a muitos e distintos olhares.
Outras vezes, somos como os que sabem que a verdade depende de intenções íntegras, que se materializa na disposição empática de compartilhar e no desprendimento de quem caminha junto, respeitando e abrindo-se às visões do outro para descobrir espaços fora da caverna.
Enfim, na geografia da verdade de cada um, há abismos, terrenos pedregosos e desertos cheios de miragens, por isso, o mais coletivo dos exercícios é percorrer o território da verdade em comunhão.
Pois, ninguém o constrói ou chega lá sozinho.
Querida Lidu,
Palavras são insuficientes para expressar o que me proporciona a leitura de seus
ensaios…
Você sempre nos pergunta quando escreve:
– Como você se sente com relação a si mesmo e a sua vida?
O melhor de tudo, é que faz isso, permitindo-nos encarar e lidar com nossos aspectos não evidentes.
É admirável o fruto de seu trabalho. Por suas palavras habitualmente gentis, estumulas verdadeiros exercícios para autoconscientização.
Permita-me dizer que você sabe escrever sobre a verdadeira sensação de viver!
Amo-te,
Bruno
Bruninho, você é uma fonte inestimável de carinho. Sou tão grata a Deus pela sua amizade. Obrigada pelas palavras de estímulo, faz 7anos que publico o Blog e às vezes, bate uma vontade de desistir e são leitores como você que me estimulam a seguir adiante. Amo-te.
Minha querida Mestra, que privilégio poder receber este texto de presente! Concordo sim que a verdade não se constrói sozinho e você sabe buscá-la como poucos.
Um abraço cheio de carinho.
Querida Emília,
recebo os comentários aos textos que publico, como valiosos estímulos.
Mas, seu comentário é pra mim, um presente, por sua capacidade de ver com olhos
sensíveis e inteligentes, o que está à sua volta.
Creia-me, seus comentários ajudaram a matar um pouco daquela vontade que, às vezes,
minha alma sente de desistir.
Obrigada.
Beijo.