
Feriado. Dia ensolarado. Dia do trabalhador.
Resolvo escrever sobre o dilema entre trabalhar e ficar ocioso.
Mas, por ser feriado, permito-me permanecer um pouco mais na cama. Vou folheando aleatoriamente o Livro do Desassossego. A biografia sem fatos de Fernando Pessoa. A leitura preferida do momento.
Aí, não escapo de pensar sobre a relação trabalho e ócio. O livro me agarra logo no trecho 45. Parece magia. Tudo o que está escrito ali vai ao encontro da conexão entre ocupar-se com algo ou não.
O que leio diz: ‘Estagnar ao sol, douradamente, como um lago obscuro rodeado de flores. Ter, na sombra, aquela fidalguia da individualidade que consiste em insistir para nada com a vida. Ser no volteio dos mundos uma poeira de flores’.
Penso em desistir de escrever. Depois de ler Fernando Pessoa, parece que tudo o que se vai escrever será inútil.
Mas, a inquietação persiste. O que separa essas duas faces da existência humana: ócio e trabalho?
E logo ao dobrar a primeira esquina do pensamento, percebo que enxergamos o trabalho apenas do ponto de vista econômico. E como isso nos faz esquecer de que a contemplação, assim como o trabalho são atos humanos.
E todo ato produz algo. Entretanto, a estreiteza de visão não nos ajuda a enxergar os produtos do ócio. Antagonizamos ócio e trabalho, mas todo trabalho flerta com o ócio. Todo ócio quer ação.
A contemplação e a ação nos forjam o espírito e o ânimo.
Trabalhar conscientes da importância de compreender o que se faz. Enxergar-lhe o sentido. Saber que no exato momento da ação é possível dissociar-se da tarefa nos seus aspectos mais imediatos, para compreendê-la mais e ao mundo. E assim, ser capaz de produzir objetos tangíveis ou intangíveis cheios de sentidos para si e para os outros.
Um e outro, ócio e ação, são intermitências com limites intocáveis. Ócio permanente vira tédio. Trabalho ininterrupto vira escravidão.
Mas, hoje é feriado. Dia marcado para o predomínio do ócio, então, resolvo interromper a cadeia de pensamentos sobre contemplar e agir.
Para não deixar o texto inacabado, peço ajuda novamente ao bardo português. Ele exercia a função de guarda-livros e considerava sua atividade muito distante da vontade que sentia de sobreviver do que escrevia. Não conseguiu o objetivo, mas deixou-nos páginas que só quem se permite contemplar a vida pode produzir:
‘Viver uma vida desapaixonada e culta, ao relento das ideias, lendo, sonhando, e pensando em escrever, uma vida suficientemente lenta para estar sempre à beira do tédio, bastante meditada para nunca se encontrar nele’.
O trabalho e o ócio nos conferem permanência. Eternizam nossas ânsias e nos projetam para além de nós mesmos.

É… para se permitir e viver um bom momento com ambos, é interessante ter um sentido, no mínimo agradável.
Muito bom. Continue nos inspirando com o que escreve.
Fiquei refletindo sobre o texto e cheguei a conclusão que para se chegar ao extâse do ócio é preciso muito trabalho
maravilha de texto !
pude refletir que o equilíbrio entre os dois ” ócio e trabalho ” é que dá sentido à vida.
Parabéns Lidú !
Lidú, como é bom ler o que você escreve, nos presenteando com esses artigos maravilhosos! Não desista nunca, mesmo depois de citar Fernando Pessoa, a sua leitura e maneira de ver o mundo nos inspira sempre! Parabéns!
Lidu, mais uma vez, nos presenteando com pérolas hauridas da sua fecunda capacidade de expressar pensares e sentires com uma clareza pedagógica e uma beleza poética que nos impacta e nos encanta a cada novo texto. Parabéns! Saudades!
Magnífico. Vc é inconfundível. Bjo nesse coração lindo.
Meditando este belo texto, subscrevo o que a autora expõe. “Ócio permanente vira tédio. Trabalho ininterrupto vira escravidão.”
Devemos buscar este equilíbrio entre trabalho e descanso. Como de modo sapiente disse Karl Marx, o trabalho sem descanso aliena a obra.
VALFISIA
Palavras sabias minha querida Lidu, obrigada por mais uma oportunidade de reflexão. Bj